sexta-feira, 17 de abril de 2009

Estatutos do Homem de Thiago de Melo


Estatutos do Homem de Thiago de Melo


Conheço os “Estatutos do Homem”, de Thiago de Mello desde 1972, aproximadamente e lembro-me de que me maravilhei, sentindo um forte impacto na minha alma: dei por mim a observar o mundo e senti dentro de minha alma uma imensa vontade de contribuir para que um dia o mundo fosse melhor.
Gostava de compartilhar com todos visitantes porque é lindo.



Estatutos do Homem

(Acto Institucional Permanente)


Artº1º – Fica decretado que agora vale a verdade, que agora vale a vida, e que de mãos dadas trabalharemos todos pela vida verdadeira.

Artº2º – Fica decretado que todos os dias da semana inclusive as terças-feiras mais cinzentas têm direito a converterem-se em manhãs de domingo.

Artº3º – Fica decretado que a partir deste instante haverá girassóis em todas as janelas e que os girassóis terão o direito de abrir-se dentro da sombra.

Artº4º – Fica decretado que o Homem não precisará mais de duvidar do Homem, que o Homem confiará no Homem como a palmeira confia no vento, como o vento confia no ar, como o ar confia no campo azul do céu.

PARÁGRAFO ÚNICO – O Homem confiará no Homem como um menino confia noutro menino.

Artº5º – Fica decretado que os Homens estão livres do jugo da mentira. Nunca mais será preciso usar a couraça do silêncio nem a armadura das palavras. O Homem sentar-se-á à mesa com o seu olhar limpo, porque a verdade passará a ser servida antes da sobremesa.

Artº6º – Fica estabelecida, durante dez séculos a prática sonhada pelo profeta Isaías que o lobo e o cordeiro pastarão juntos e a comida de ambos terá o mesmo gosto de outrora.

Artº7º – Por decreto irrevogável fica estabelecido o reinado permanente da justiça e da claridade e a alegria será uma bandeira generosa que será sempre desfraldada na alma do povo.

Artº8º – Fica decretado que a maior dor sempre foi e será não poder dar-se amor a quem se ama e saber que é a água que dá à planta o milagre da flor.

Artº9º – Fica permitido que o pão de cada dia tenha no Homem o sinal do seu suor mas que sobretudo tenha sempre o quente sabor da ternura.

Artº10 – Fica permitido a qualquer pessoa a qualquer hora da vida o uso do traje branco.

Artº11º – Fica decretado, por definição, que o Homem é um animal que ama e que por isso é belo, muito mais belo do que a estrela da manhã.

Artº12º – Decreta-se que nada será obrigado nem proibido, tudo será permitido, inclusive brincar com os rinocerontes e caminhar pelas tardes com uma begónia na lapela.

Parágrafo único – Só uma coisa proibida: Amar sem Amor.

Artº13º – Fica decretado que o dinheiro não poderá nunca mais comprar o Sol das manhãs vindouras, expulso do grande baú do medo, o dinheiro se transformar-se-á numa espada fraternal, para defender o direito de cantar a festa do dia que chegou.

Artigo Final – Fica proibido o uso da palavra Liberdade, a qual será suprimida dos dicionários e do pântano enganoso das bocas. A partir deste instante a Liberdade será algo vivo e transparente como um fogo ou um rio, ou como a semente de trigo e a sua morada será sempre no coração do Homem.

Santiago do Chile, Abril de 1964

Thiago de Mello

Apontamento biográfico de Thiago de Mello

Thiago de Mello, nasceu na cidade de Barreirinha, no Amazonas, no dia 30 de Março de 1926, o poeta ainda criança, mudou-se para Manaus, onde iniciou os seus primeiros estudos, depois mudou-se para o Rio de Janeiro, onde ingressou na Faculdade Nacional de Medicina até o quarto ano. Abandonou o Curso e entregou-se por inteiro o caminho da arte poética.
Conhecido internacionalmente pela sua luta em prol dos direitos humanos e pela ecologia, tendo sido perseguido pela ditadura militar, implantada no Brasil, foi obrigado a deixar a sua terra, tendo-se exilado no Chile.
Considerado um dos grandes escritores brasileiros e um dos mais traduzidos, aos setenta e cinco anos de idade, Thiago de Mello completa meio século de poesia, com uma indicação ao prémio Jabuti/2002 pelo seu livro Poemas Preferidos (Bertrand Brasil, 294págs.)
O poeta Amazonense vive actualmente em Barreirinha sua terra natal, uma vila de cinco mil habitantes, no Baixo Amazonas.

Flor de açucena
Thiago de Mello

Quando acariciei o teu dorso,
Campo de trigo dourado,
Minha mão ficou pequena
Como uma flor de açucena
Que delicada desmaia
Sob o peso do orvalho.
Mas meu coração cresceu
E cantou como um menino
Deslumbrado pelo brilho
Estrelado dos teus olhos.

Para saber mais:
WWW.releituras.com/tmello_menu.asp

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